Preciosidades

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Conto erótico. Davi M. Gonzales


"Entre limites de idade que vão dos nove aos catorze anos, existem meninas que, diante de certos viajantes enfeitiçados, revelam sua verdadeira natureza, que não é humana, mas nínfica (isto é demoníaca), e a essas dadas criaturas proponho designar como ninfetas". (Vladimir Nabokov — Lolita, 1955)
I

Ele 41, ela 14. Ele, marcado pelas ameaçadoras entradas na já escassa cabeleira e o semblante mais que cansado, resultado do dia de trabalho maçante. Ela, exuberante: curvas realçadas pelo micro short branco e a mini blusa, olhos amendoados e cabelos loiros e longos. Uma graça. Ele tio, ela sobrinha, filha mais velha de sua irmã.  Mas não é só a beleza física que a torna tão atraente, existe algo de particular em seus modos, sua maneira de falar, seu jeito de vestir. Uma áurea que costuma brindar apenas algumas poucas meninas de sua idade...
II

— Então, quando vamos?
Não é a primeira vez que o assunto vem à baila, e tão pouco será a última. Todas as vezes que estão a sós é a mesma estória: ela faz aquele beicinho e inclina o corpo para frente,  um gesto talvez não tão inocente e que torna o decote completamente acessível.

— Acha ainda que sou uma menininha? Olhe direito...
Faz pose, passando as mãos pelos quadris.
— Vê se te enxerga pirralha!
Ela se aproxima ainda mais e o acaricia de leve no peito.
—Tenho tudo planejado: lembra aquele dinheiro que ganhei no final do ano, com o concurso de contos lá do colégio? Pois então, guardei até hoje para esta ocasião especial. Afinal, precisa ser um lugar de classe...
— Nem pensar... Por que não arranja alguém da sua idade?
— Nossa! Que durão... Adoro homens durões... Bom, já que você insiste em se fazer de tão difícil, talvez eu convide o Marcelinho, não acho que ele me dispensaria desta maneira...
— O moleque que mora ali na esquina, aquele com cara de paspalho?
— Realmente ele não tem assim uma fisionomia tão inteligente, mas pelo menos não vive se escondendo pelos cantos, com medo da mulherzinha...
— Mais respeito com sua tia. Perdeu a vergonha é? O que pensa que ela diria se soubesse dessa estória?
— Este é o grande problema de vocês homens, pensam demais... Jamais se deixam levar pelo instinto. Precisa relaxar um pouco, assim qualquer dia enfarta... Fica tranqüilo. Ninguém vai saber... Emprestei o documento de identidade de minha amiga Patrícia. Aí é só caprichar no visual e na maquiagem. Vai ser moleza...
Mesmo a contragosto dele, marcam para quinta-feira. Inventaria alguns clientes americanos de última hora e resolveria a situação de vez. Mas apesar de toda segurança e maturidade de suas quatro décadas bem vividas, não pôde afastar todos os seus receios, e a noite anterior se passa sem que consiga pregar os olhos.
Pára o carro no local combinado, certifica-se de que não são observados e só então a manda entrar.  Depois, pede a ela que fique agachadinha no banco, pelo menos até saírem do lugar, já que podem topar com alguém conhecido. Não pôde deixar de notar a minissaia branca, que pouco esconde de suas coxas perfeitas. Em seguida sente algo de terror, quando se depara bem na esquina, com a vizinha moradora da casa ao lado da sua. Fofoqueira de carteirinha... Acena discretamente tentando esboçar um sorriso. Parece não ter notado sua passageira. Não gostaria de ter que inventar uma série de explicações para aquilo que está tão claro.
Subitamente, sente-se ridículo. Ridículo, mas vivo. Sente-se incrivelmente vivo, como quando contava seus dezenove anos. Uma sensação que há muito não tinha. Questiona-se então se a isto não se deva o fato de tantos homens de meia idade, apaixonarem-se por garotinhas, chegando mesmo a abandonar esposa e filhos. Afinal quem não gostaria de ter de volta seus dezenove, conservando a experiência dos quarenta?
Ela parece alheia a tudo isso. Interessa-se apenas pelo momento, sem conseqüências.

— Então? Já posso olhar?
Levanta-se com uma agilidade que o faz novamente notar o frescor daquela juventude. Ela aninha-se em seu peito com suavidade e descansa em segurança por todo o restante do caminho.
III

Pequena fila na entrada do motel. Mais uma vez a preocupação de encontrar alguém conhecido. Mas afinal, para que preocupar-se — encontros em filas de motel possuem a invariável tendência de manterem-se sigilosos, com o apoio de todas as partes envolvidas. Se alguém topasse com eles ali, naquela hora, não fariam publicidade do ocorrido. Sabe-se que a coisa funciona como um acordo de cavalheiros... Uma pequena confraria...

Ali, naquele momento, com ela aninhada em seu peito, ele torna-se ainda mais sem jeito.

— Tio, não precisa ficar assim... Sabe que gosto muito de ti, não sabe? Prometo que terminamos logo e então pode ir correndo para casa: para os braços de sua querida e irritante esposa... Aposto que neste exato momento ela está esfregando seu famoso creme anti-celulite, vestida com seu chiquérrimo "baby-doll made in Marisa".
— Olha o respeito pirralha... Ela é sua tia...
— Nossa vez! Anda, se bobear furam a fila...
Já dentro da suíte, seus olhinhos brilhantes ficam deslumbrados, não se cansando de verificar todos os cantos do aposento. Mas é ele quem primeiro toma a palavra:
— Então? Gostou? É como você imaginava? Tive uma idéia: por que não tira algumas fotos, com o celular?
— Grande idéia tio, já estou imaginando a cara da Taty, quando eu contar que estive aqui... As meninas nem vão acreditar...
— Bem... Agora quem vai relaxar sou eu: vou aproveitar a hidromassagem e tomar um bom banho. Quando sentir que sua curiosidade foi satisfeita, é só bater na porta e vamos embora. Ah! Já ia esquecendo: nem pense em ligar a TV, aqui só passa filme de sacanagem...

— Valeu tio! Você é demais!

Todos os direitos de reprodução deste conto pertencem a Davi M. Gonzales, escritor. Publicada na Antologia do Prêmio UNIVAP – Fundação Valeparaibana de Ensino (2005).


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.